sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

Um parâmetro ético

Este texto encontra-se agora em Para ser escritor, Editora Leya, 2010.

sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Uma célula só

Antes da partenogênese inicial, e por uns trinta minutos, todos nós fomos uma célula só.

Agora, buscamos essa unidade perdida no amor, na arte, as únicas coisas capazes de oferecer uma pequena ilusão de integridade e permanência neste mundo em acelerado processo de desagregação.

Sobre as mulheres de escritores

Este texto encontra-se agora em Para ser escritor, Editora Leya, 2010.

quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

Dez grandes contos de mulheres

No dia 08 de março, como já afirmei aqui, vou lançar uma nova antologia de contos escritos exclusivamente por mulheres, o Outras mulheres, que reúne contos de 16 alunas de minhas oficinas literárias, contos escolhidos por concurso, do qual participaram mais de 80 escritoras.

Enquanto o livro não chega às livrarias, indico aqui a lista de meus 10 contos preferidos escritos por grandes escritoras de vários países. A ordem é a aleatória, não segue sequer a alfabética. O que significa dizer que não tenho preferência de classificação por nenhum deles. São apenas 10 contos de que gosto muito. Poderiam ser 100.

1) “Um bom homem é difícil de encontrar”, de Flanery O´Connor (EUA)

2) “O passarinho dos domingos”, de María de Montserrat (Uruguai)

3) “Um tiro de misericórdia”, de Marguerite Yourcenar (França)

4) “Mãe”, de Lídia Seifullina (Rússia)

5) “Uma xícara de chá”, de Katherine Mansfield (Nova Zelândia)

6) “Big Loira”, de Dorothy Parker (EUA)

7) “Felicidade clandestina”, de Clarice Lispector (Brasil)

8) “Venha ver o pôr-de-sol”, Lígia Fagundes Telles (Brasil)

9) “A figueira de Judas”, de Katherine Anne Porter (EUA)

10) “A duquesa e o joalheiro”, de Virginia Woolf (Inglaterra)


Não é por acaso que incluí 3 autoras norte-americanas. Poderia fazer a lista somente com escritoras do país do Norte. Em nenhum lugar do mundo a mulher é tão respeitada quanto lá.

Sem igualdade e sem respeito, fica difícil escrever, não é mesmo, gurias?

quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

Duas obsessões

Este texto encontra-se agora em Para ser escritor, Editora Leya, 2010.

segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

Torneio de xadrez

No sábado, 11 de janeiro, na Livraria Palavraria, fizemos um Torneio de Xadrez entre os participantes das minhas oficinas literárias.

Juarez Guedes Cruz, grande contista, organizou tudo. Fez as tabelas de emparceiramento, trouxe os tabuleiros produzidos em pano por sua esposa, e venceu. A rigor, todos esperavam que isso acontecesse. Quem já se defrontou com o Juarez sabe que ele não só maneja bem as peças da literatura. Bispos, cavalos e torres, no tabuleiro do Juarez, são ferozes. Suspeito, até, que este nome “Juarez”, seja uma corruptela lingüística de “ajedrez”. Se não for, é uma excelente rima!

Joguei um pouco de xadrez no passado, fui aluno de Serpa, bicampeão estadual, freqüentei o Clube Metrópole. Mas quando compreendi a profundidade da minha ignorância enxadrística, desisti. O campo teórico do xadrez é infinito, e o prático, inalcançável para quem não se dispõe a praticar e praticar e praticar.

Desse meu passeio pelo mundo do xadrez, restou um conto, que publiquei nos anos 80. Ele está na Antologia pessoal, livro que me deu a terceira estatueta do Prêmio Jabuti, em 1999. Pelo visto, sempre fui melhor contista que enxadrista.

Mas admiro muito o jogo e os jogadores de xadrez. Pela complexidade, pela beleza, pela inutilidade. O lúdico é isto, algo que se esgota em si mesmo, pelo simples prazer de ser.

Lá, no passado, imaginei uma história simples, de um homem que dedicou a vida ao xadrez e que chegou a uma grande final. Nós, que escrevemos, sabemos tudo sobre os nossos personagens. Pois eu sabia de cor a partida em que meu personagem sacrificava um cavalo e perdia por tempo. Desde então, vi milhares de partidas, em livros, em computadores, sobre os tabuleiros (jogo, às vezes, com meu genro. Já que ele ganhou a filha, de vez em quando obrigo-o a perder a dama), mas nunca encontrei uma variante parecida com a minha. Até sábado. Na partida entre Pena Cabreira e Beto Canales, a partida do meu conto realizou-se diante dos meus olhos. Mas o Pena, que é completamente diferente do personagem do conto, sacrificou o cavalo, arrematou a partida e ficou em segundo lugar no Torneio.

Por isso, desde sábado, o velho conto ganhou uma dedicatória. Em novas edições em livro, ela estará lá também.

Como dizia Nietzsche, num universo de infinitas possibilidades todas as possibilidades são possíveis, até mesmo uma partida de xadrez repetir, na vida real, o que sonhou um escritor.

sábado, 16 de janeiro de 2010

Sacrifício de cavalo (Conto)

(Para Pena Cabreira)

Tinha, enfim, conseguido. Depois de muitos anos de treinamento rigoroso, privações, milhares de partidas de grandes mestres estudadas e decoradas, intermináveis exercícios táticos e estratégicos, estava a um movimento de desencadear a possível variante que o levaria, através do sacrifício de seu último cavalo, à vitória e ao título.

Uma vida inteira dedicada a este instante: um casamento fracassado — a mulher não suportara a sua obsessão, não podia compreender tamanha paixão por um jogo que se esgotava em si mesmo, que a nada levava, que nada produzia — e uma carreira profissional em ascensão barrada por peões passados, torres em sétima e bispos em fianqueto.

Avaliou e reavaliou a situação: tinha vantagens teóricas evidentes, cadeia de peões contra peões isolados, todas as peças ligeiras bem desenvolvidas, dama com maior mobilidade, além do violentíssimo impacto psicológico que o seu próximo lance desencadearia na alma do oponente.

Sorriu, antegozando o prazer de esmagá-lo. Já podia comemorar o título, alguns lances a mais e o inimigo estenderia a mão, rendido, humilhado.

Levantou o cavalo, a mão úmida tremeu. “Sacrificar um cavalo”, pensou. “Um cavalo...“ Manteve a peça no ar uma eternidade, indeciso ainda.

O sacrifício de uma peça gera sobre o tabuleiro uma verdadeira tempestade, quebra toda a harmonia, instaura o caos. E ele amava a ordem, a lógica precisa e retilínea, o jogo posicional. Era imprescindível reavaliar a situação. E se o Outro, hábil caçador, farejasse o perigo e recusasse a oferta? Se sob aquela fraqueza estrutural tão evidente se esgueirasse um terrível e pantanoso golpe tático, uma daquelas seqüências crípticas, demoníacas, tão freqüentes no mais amaldiçoado dos jogos?

A mão suspensa, ouvia o tiquetaquear do relógio, mas não desviou os olhos, a menor desconcentração podia ser fatal. Teve a nítida impressão de ouvir risos, velados ainda, é verdade, mas que cresciam e se transformavam em chacota. Uma vida inteira. Anos a fio, dia após dia, jogando, jogando, jogando, correndo atrás da fugaz alegria, sofrendo o brutal esmagamento do ego, empurrando peões montanha acima. Precisava reconhecer, era um jogador medíocre, dos que ao final de uma vida de disciplina espartana e incessantes estudos perdem fragorosamente para crianças-prodígios, esses seres tocados pelo Grande Arquiteto. Lembrou de Mequinho, Bob Fischer e Judith Polgar.

Segurou o cavalo no ar e sentiu uma dor funda, a súbita compreensão de sua insignificância. Nem era preciso procurar muito longe. Ali, no próprio torneio, havia dezenas de jogadores melhores do que ele. Era um miserável, dos que no cinema lotado sempre encontram um lugar vago exatamente atrás de um grandalhão que lhes impede qualquer visão da tela. Mas aquela era a sua chance, o momento esperado há tantos anos. Sacrificaria o cavalo, instauraria a confusão generalizada nas tropas inimigas e arremataria de forma brilhante. Além do título de campeão, receberia o prêmio de melhor partida.

Era só lançar o cavalo contra o peão protegido.

“Sacrificar um cavalo...“, pensou. “Um cavalo...“

Ia retomar a análise, mas o adversário já sorria e apontava-lhe a seta do relógio caída.

sexta-feira, 15 de janeiro de 2010

Auto-elogio

Meu último livro – A revolta das coisas – é um tributo à vida, a possível felicidade, à harmonia entre os seres e as coisas. Embora para crianças, é um romance em miniatura. De estrutura complexa (para os pequenos), em que fábula e trama não são concomitantes, talvez não seja entendido por algum leitor-mirim, mas os pais estão aí para isso mesmo, para tornar o mundo e a arte explicáveis.

Subordinei tudo ao acabamento, à noção de que obra é um todo orgânico e esférico.

Sei que escrevi um bom livro, um livro que me dará muitas alegrias. E a primeira delas, a mais importante, já me foi dada. Ao lê-lo para Sofia, sete anos e muita literatura infantil já consumida, ela me disse, sorrindo:

– Gostei muito, papai – e meu deu um abraço apertado.

Esta mesma expressão, "gostei muito", é o que digo quando algum aluno, em aula, apresenta um bom texto.

Meu livro infantil é uma ode à democracia, ao consenso, à esperança. Confrontadas por três hipóteses para solucionar um problema grave, as coisas, personagens do livro, optam pelo caminho do meio.

Ao ultrapassar os cinqüenta anos, eu também estou mais sóbrio. Nem mais os arroubos da juventude, nem a passividade senil. Acredito, cada vez mais, na persuasão. E no poder da arte, sem a qual, segundo Nietzsche, morreríamos todos loucos.

quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

Um novo editor

Quando se atinge certa idade (o eufemismo, aqui, significa mais de cinqüenta), a gente se torna uma espécie de profeta. É como jogar xadrez. Ao se observar as peças dispostas no tabuleiro, ao se fazer o necessário relacionamento entre causas e efeitos, ao se perceber as potências estáticas e dinâmicas de torres, bispos e cavalos, somos capazes de “sentir” se o jogo resultará em vitória ou derrota.

Assim é na vida.

Trabalhei muitos anos em editora, tenho uma razoável visão da área, que é complicada, pouco rentável e desgastante. Tive alunos e alunas com variados talentos, inclusive empresariais. Mas, poucas vezes, tive por perto alguém com tanta competência editorial quanto a de Rodrigo Rosp.

Guardem este nome.

Henrique Bertaso, Ivan Pinheiro Machado e Roque Jacoby, que foram grandes editores, têm, enfim, um digno concorrente.

Rodrigo Rosp lembra Steve Job, que apostou na Pixar e a transformou num estúdio capaz de concorrer com o de Disney. Nos últimos dois ou três anos, Rosp criou duas editoras, a Não Editora e a Dublinense.

Confesso que nunca gostei da proposta da Não. Palavras são muito poderosas. Aliás, uma hora dessas vou contar aqui histórias sobre o poder da palavra, de como a bomba atômica foi inventada por H. G. Wells, de como Sófocles levou Colombo a descobrir a América, de como um escritor descreveu a primeira e última viagem do Titanic seis anos antes dela acontecer...

Palavras sagram reis, esconjuram tempestades, movem montanhas. A terrível negatividade do nome da editora não a deixará prosperar.

Coloco todas as minhas fichas, depois de espiar em minha bola de cristal, na Dublinense.

Se, como no xadrez, não houver nenhum acidente de percurso, se Rodrigo Rosp não deixar uma Dama no ar, essa pequena editora gaúcha fará uma partida extraordinária.

É bom que o Rodrigo saiba que no xadrez, como na vida, vence quem sabe articular melhor os dois planos do jogo, o tático e o estratégico.

Tática Rosp tem de sobra, falta-lhe ainda melhor estratégia. Mas ela virá com a experiência.

terça-feira, 12 de janeiro de 2010

Outras mulheres

Dentre as muitas antologias de contos que organizei, existe uma pela qual nutro um singular carinho. Trata-se de O livro das mulheres, que lancei na Feira do Livro de Porto Alegre, em 1999.

Hoje, é objeto raro.

Pouco se fala, em teoria da literatura, do olhar do organizador. No limite, o organizador define, em seu recorte, aquilo que ele julga o melhor de uma determinada época. Claro que esse recorte é parcial, ideológico, subjetivo e sujeito a pressões de todos os tipos, internas e externas. Por que estas autoras e não outras? Por que estes contos e não outros?

Do mirante teórico em que me encontrava, julguei que mereciam fazer parte da minha antologia escritoras que surgiam no Rio Grande do Sul nas décadas de 80 e 90, algumas egressas das minhas próprias oficinas, outras das oficinas de Assis Brasil, entre as quais Letícia Wierchowski, Cintia Moscovith, Adriana Lunardi, Cláudia Tages, Paula Tautelbaum, Martha Medeiros, Lízia Pessin Adam, Vera Karan e outras. Escolhi 13, porque o número 13, naqueles tempos, era um símbolo forte.

A história mostrou que não me enganei, as autoras daquela humilde antologia hoje são as grandes damas da literatura gaúcha.

Postei em http://fortunacriticadecharleskiefer.blogspot.com/ duas resenhas que saíram na imprensa, à época do lançamento. Se alguém tiver curiosidade sobre o que se disse então, basta clicar duas vezes sobre o link.

E agora, passados 11 anos, vou lançar a segunda antologia com contos femininos. Vai se chamar Outras mulheres. E volto a apostar que o futuro me dará razão. Por enquanto, os nomes das novas grandes damas da literatura do Sul ainda é um segredo. (Nem tanto, que na era da informação instantânea, os nomes das “outras mulheres” já estão circulando. Adianto que, desta vez, eu as escolhi a partir de um concurso literário. Hoje, são tantas as boas narradoras nesta terra meridional que foi preciso mudar o método de escolha. Participaram do concurso mais de 80 escritoras).

Assim, no dia 08 de março de 2010, quando a Editora Dublinense lançar o livro, os jornais e revistas falarão daquelas que na próxima década estarão fazendo sucesso como cronistas, contistas, romancistas. Escolhemos esta data, em que se comemora o Dia Internacional da Mulher, por nos parecer o dia mais adequado para o lançamento de uma obra escrita somente por mulheres. A sensação que tenho é que, num futuro não muito distante, os leitores disputarão Outras mulheres nas livrarias-sebos como hoje disputam O livro das mulheres.

Como se pode ver, não penso que o livro de papel, brochura de variados tamanhos, vá desaparecer por causa dos e-readers. Ele vai se fetichizar, vai se tornar objeto de culto. Poucos o terão e valerá muito. Alguém aí poderia me informar quanto custa, no mercado de obras raras e objetos antigos, um rolo de papiro?

Também nesta nova antologia estou abrindo mão dos direitos autorais de organizador. O gesto simboliza, apenas, que as faço por absoluta paixão. E para aumentar a pontuação no currículo Lattes, dirão os maldosos. Absolutamente não, pois já fui excluído do corpo de professores do mestrado em Escrita Criativa da PUC por falta de pontuação. Não tenho publicado mais ensaios acadêmicos em livros e revistas, não vou a Seminários e Congressos, participo de poucas bancas de mestrado e doutorado. Enfim, faço uma não-carreira acadêmica.

Se outros se jactam do que escreveram, eu me jacto do que escrevem os meus alunos e alunas.

sábado, 9 de janeiro de 2010

Fazendo política

Antes que me acusem de “estar fazendo política”, quero deixar bem claro que “estou fazendo política”. Para quem vive em sociedade, para quem não anula o voto, como eu não anulo, para quem escreve, para quem leciona, a política é o próprio ar que se respira.

Todos os atos humanos, fora do essencialmente natural, são atos políticos. Por isso, me causa espanto e riso quando ouço dizerem que a “oposição está politizando isto ou aquilo”, como se a “situação” não estivesse exercendo a sua política o tempo todo.

No dia em que se assume um cargo, inicia-se a luta pela manutenção do cargo. Esta é a dinâmica da vida social. É um direito e um dever dos que perderam seus cargos lutarem pelo retorno ao statu quo ante. E se não lutamos por cargos, como é o meu caso, lutamos por aqueles que, no cargo, expressem a nossa visão de mundo, ou seja, aqueles que façam a nossa política.

A tese, por exemplo, da neutralidade política é detestável. Porque ela, na verdade, esconde o que o ser humano tem de mais humano, a consciência. O neutro, lá no fundo do coração (como dizem os ingênuos e românticos), sabe muito bem de que lado está. A sua neutralidade é uma máscara, uma hipocrisia, um medo risível de não se expor, de não pagar o preço por assumir uma posição. A rigor, é um verme, como dizia Nietzsche, que se encolhe para não ser pisado.

Prefiro os meus antípodas políticos, porque com eles posso estabelecer relações confiáveis, baseadas no respeito ao contraditório. O neutro assemelha-se ao anônimo, que age na sombra, destilando rancor, e desvelando sua profunda insegurança e falta de cidadania.

O neutro esgueira-se, com medo de perder algo quando o poder trocar de mãos. Neutro, pode agir como agente duplo, traindo ao mesmo tempo a dois senhores.

Prefiro os quentes e os frios, porque os mornos me dão asco.

quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

Ainda sobre as botas do gigante

Felizmente o sr. Luis Armando Capra Filho, diretor do Museu Julio de Castilhos, enviou uma explicação sobre a questão das botas do gigante. Na condição de ex-secretário municipal de cultura, ex-diretor geral da Secretaria de Cultura do RS, entre outras ex-bobagens que fiz na vida, entendo a situação do gestor e administrador público. Geralmente se paga o pato, e, às vezes, as botas, pelos erros dos outros. É o ônus do cargo. Quem não gosta de política, não deve entrar na política.

E aqui vou me deter um pouco. Inclusive, dialogando com alguns comentários postados por leitores.

Obviamente eu sei que museu isso, que museu aquilo. Na PUC, por vários semestres, dei uma cadeira chamada "Sociedade, Literatura e Cultura" onde discutíamos a colonização cultural, a importação de padrões estrangeiros (europeus, em geral), as relações entre a conservação, preservação, reserva técnica, política cultural de acervos etc.

Mas aqui, hoje, quero abordar uma relação tensionada, problemática, um verdadeiro calcanhar-de-aquiles da gestão cultural.

O secretário de cultura, o diretor cultural, o cordenador de área é, normalmente, um quadro político, um "cargo de confiança", enquanto que os gestores internos são quadros técnicos, ditos de carreira, estáveis funcionalmente. O político pensa na política; o técnico pensa academicamente, em conformidade com o manualzinho despejado sobre ele na Universidade (com modelito europeu, né, Julia?). E aí instala-se a celeuma. Pobre diretor que tem do lado de fora da instituição a sociedade, cobrando-lhe eficiência "política", e do lado de dentro a área técnica, cobrando-lhe rigidez aos modelos, respeito às normas etc.

O caminho do meio, o caminho do diálogo, da transparência, da informação clara, objetiva e qualificada é a melhor solução.

Se, ao tentar visitar as "botas do gigante" eu tivesse recebido um folder com os argumentos expressos pelo sr. Capra Filho agora, não teria escrito a sarcástica crônica que escrevi. Ou talvez escrevesse sobre o aspecto positivo que era ele ter recolhido as botas para preservação, recuperação e tudo o mais.

Às vezes, uma boa iniciativa técnica, naufraga na má política. Aliás, em aula, muito elogiei o governo Yeda por acertos técnicos, mas sou um crítico implacável de seus desacertos políticos. Política a gente aprende com diálogo, com ouvido atento, com sensibilidade e transparência. Um museu começa pela portaria, pela qualificação dos atendentes, pelas informações fornecidas.

Carta do Diretor do Museu Julio de Castilhos

Transcrevo abaixo a carta que recebi do Diretor do Museu Julio de Castilhos, sobre o texto que escrevi a respeiro das "botas do gigante".

"Sr. Charles Kiefer.

Tomei conhecimento, através de mail que chegou ao Museu Julio de Castilhos, de fato apresentado em seu blog referente a acervo desta instituição. Sendo assim, esclareço:

Dentre as missões confiadas aos museus, tanto pelo código de ética do Conselho Internacional de Museus quanto pela Lei Federal nº. 11904, que institui o Estatuto dos Museus, duas atribuem intensa responsabilidade ao gestor: a salvaguarda do acervo e a informação ao público.

A primeira trata da preservação e da garantia da integridade do patrimônio confiado à Instituição, pontuada na adoção de medidas de controle, segurança e manutenção das peças do acervo. A segunda garante a posição Institucional, o serviço para a sociedade, o compromisso e a responsabilidade com o público, traduzida na qualidade do conhecimento produzido e difundido por meio dos testemunhos materiais, as coleções, guardadas no Museu, que devem seguir critérios técnicos de documentação e pesquisa.

Os objetos museais, assim como todos os materiais, sofrem com a ação do tempo e das intempéries ambientais e estruturais a que são submetidos. O museu deve monitorizar cuidadosamente o estado de conservação do acervo para determinar quando um objeto necessita de trabalho de conservação/restauro com serviços especializados. O objetivo primordial deverá ser a estabilização da peça. Todos os procedimentos relacionados com a conservação devem ser documentados e reversíveis, e todos os elementos adicionados, bem como as alterações físicas ou genéticas devem ser tratados contrariando os efeitos nocivos da biodeterioração.

No caso “das botas do gigante”, objeto nº.1520 da coleção do MJC, peça que foi doada ao Museu na década de 1920 quando as instituições viviam sob um contexto museológico enciclopédico, encontra-se afetada pela má conservação em decorrência de tantos anos de exposição ininterrupta e carência de conservação preventiva.

Realizando um diagnóstico da conservação dos objetos, percebeu-se que a peça estava vulnerável, bem como outros bens culturais tombados pelo patrimônio histórico e artístico nacional, apresentando fungos, mofo, comprometimento na sua estrutura física, craquelamento, ressecamento, entre outros processos de ameaça. Não comprometer a integridade do patrimônio é uma decisão técnica definida em plano diretor numa gestão comprometida com uma política apropriada à ética museológica.

Embora possam causar conflito de interesses, procedimentos de acondicionamento em reserva técnica e retirada do circuito expositivo de peças julgadas comprometidas ou que estejam incoerentes com o nexo expositivo, são ligadas à gestão do acervo, bem como a implementação de soluções técnicas sustentáveis, especialmente em instituições de caráter público e que tem o compromisso com o serviço para ele.

Atualmente os museus utilizam uma grande variedade de especializações, capacidades e recursos materiais que têm uma aplicação muito mais vasta do que no próprio museu. Um museu deve ser dinâmico e envolvido com a sociedade, permitindo partilhar e prestar outros serviços públicos como atividades de extensão e educação. Estes serviços devem ser organizados de forma a não comprometer a missão do museu e do seu acervo.

O acervo do museu deve refletir o patrimônio cultural e natural das comunidades da qual provem. Como tal, poderá ter um valor que vai além da propriedade comum e que pode envolver fortes afinidades com a identidade local, regional, nacional, étnica, religiosa ou política. É por isso, importante que a política do museu leve em consideração estas responsabilidades, devendo ter cuidado com a prestação de dados que manifestem sentimentos e posicionamentos preconceituosos e comportamentos profissionais ilegais e condutas pouco éticas.

O Museu Julio de Castilhos nesta gestão deve aproveitar todas as oportunidades para educar e corroborar ao público sobre os objetivos, propósitos e aspirações da produção da memória coletiva, a fim de desenvolver uma melhor compreensão pública sobre a contribuição dos museus para a sociedade, através do patrimônio cultural, tangível e intangível.

Os profissionais de museus devem desenvolver a investigação, preservação e utilização das informações referentes ao acervo. Por isso, devem evitar executar qualquer atividade ou envolverem-se em circunstâncias que possam resultar em perdas de informações acadêmicas e científicas.

Os museus têm um papel ativo e múltiplo na sociedade, associado à acessibilidade e interpretação dessa memória. Desta forma, os museus possibilitam a partilha, avaliação e compreensão do nosso patrimônio.

Os responsáveis pelos museus e os que se preocupam em providenciar todos os aspectos relacionados com os mesmos, têm um comprometimento público. Isto deve balizar o seu comportamento, uma vez que essa responsabilidade não se limita necessariamente às questões administrativas, políticas ou acadêmicas. O Museu Julio de Castilhos segue o Código de Ética do ICOM e estabelece padrões mínimos que podem ser considerados pela expectativa pública razoável e com a qual os visitantes podem avaliar o seu desempenho.

Creio que falhamos em não termos transmitido corretamente a decisão da retirada da peça do circuito expositivo a todos da Instituição. O que pode ter ocasionado este ruído na informação. Situação esta que já foi corrigida.

Agradeço seu interesse e me coloco a inteira disposição para qualquer outro esclarecimento.

Respeitosamente"

Luiz Armando Capra Filho
Diretor Museu Julio Castilhos
Rua Duque de Caxias, nº. 1205 e 1231
Cep:90.010-283 - Porto Alegre - RS - Brasil
+55 (51) 3221.3959
http://www.museujuliodecastilhos.rs.gov.br/
museu_juliodecastilhos@cultura.rs.gov.br

quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

Comentários sobre um comentário

Um anônimo, leitor deste espaço, vestiu um chapéu engraçado e acusador. Leiam com atenção o que ele postou no dia 05 de janeiro deste ano. Eis a transcrição, que retirei do setor de comentários do próprio blog:

“Anônimo disse...

Hoje está chovendo por aqui, fiquei quase uma hora...

Qual será o IP deste computador? IP-roxo?

Esta reclamação velada do anonimato, feita por ti, é um caminho de duas vias. Se há pessoas que não se identificam, tu também não permite que haja a divulgação de mensagens de anônimos, ou mesmo aquelas, identificadas, que venham a criticar as tuas posições.

Foi por isso que abandonei as oficinas. Autoritarismo demais, como só houvesse "inteligentsia" na pessoa do comissário Kiefer.

Não seria o momento de fazer uma "perestroika" no teu método de trabalho?

Vou ficando por aqui, antes que a KGB me localize...

Saudações, camarada!”

Vamos por partes:

1. O IP do teu computador fica, sim, registrado a cada acesso no Statcounter.com, que foi colocado em meu blog por minha filha Maíra, não para que soubéssemos quem acessava, mas para sabermos quantos acessavam... Ao mexer no programa, descobri coisas que eu nem sonhava. Enfim, agora eu sei, por exemplo, como a Polícia Federal chega à casa dos pedófilos e consegue prendê-los. Como toda tecnologia, tem um lado bom e um lado mau. O bom é que se pode fazer justiça; o mau, é que é um instrumento de controle e de poder. Nas mãos de governos ditatoriais sabemos onde se pode chegar...

2. A reclamação que fiz contra o anonimato não é velada, mas clara, objetiva e ética. Considero o anonimato um desrespeito, uma calhordice, uma covardia. Na sociedade democrática em que desejo viver todos têm o direito de expressar a sua opinião, mas quando fazem acusações pessoais, quando caluniam, devem ser responsabilizados. Aliás, minha luta contra o anonimato não é expressa apenas aqui. Em artigo que escrevi para o Jornal Extraclasse já havia definido a minha posição. O artigo pode ser lido aqui mesmo e se chama “Eu assino o que escrevo”.

3. Dizes que eu não permito a divulgação de “mensagens de anônimos, ou mesmo aquelas, identificadas, que venham a criticar as tuas posições”? Mas e o que fazes aqui, cara pálida? Deletei uma única mensagem anônima, que agredia pessoalmente um escritor gaúcho (que nem faz parte das minhas relações) e vou deletar toda mensagem que fizer acusação ou calúnia contra quem quer que seja. Contra mim, tudo bem, mas não usem o espaço sob minha responsabilidade para esse tipo de ação criminosa (que é disto que se trata).

4. Repito a tua afirmação: “Foi por isso que abandonei as oficinas. Autoritarismo demais, como só houvesse "inteligentsia" na pessoa do comissário Kiefer. Não seria o momento de fazer uma "perestroika" no teu método de trabalho?” Hilário. Se segurança, entusiasmo e rigor são autoritários, tens razão. Foi melhor teres abandonado, porque os que ficam comigo são éticos, conscientes, têm posições políticas claras. É fácil te esconderes atrás do anonimato e me chamares de “comissário”, como se eu fosse delator, como se eu estivesse a serviço de algum partido político, como se eu perseguisse alguém. Meus alunos são adultos, pagam mensalidade e saem quando querem. Anônimos, sim, têm um bom perfil para o “comissariado” a que te referes. Homens como eu, que agem a luz do dia, que enfrentam as questões e respeitam o contraditório, costumam ser perseguidos pelos “comissários”, costumam ser atacados pelos sistemas políticos autoritários. Tenho feito constantes revisões em meus métodos de trabalho, como disso testemunham Rudiran Messias, Reginaldo Pujol Filho e Monique Revillion, que estão em minhas oficinas há 16 anos! A partir de uma pesquisa que minha orientanda Luciane Tavares fez na PUC, nas aulas de Escrita Criativa, estou modificando meu método mais uma vez (isto lá na Universidade, onde o perfil do aluno é completamente diferente do perfil dos alunos das oficinas particulares). E sempre que eu perceber que algumas coisas não funcionam nos meus métodos (porque eles são plurais), irei alterá-los. Como tu és anônimo, não poderemos dialogar sobre isso. Se, diante de alguma discussão teórica que tivemos em sala de aula, tivesses permanecido (e não saído como declaras), talvez teus pré-conceitos a meu respeito, hoje, fossem outros.

5. Esta afirmação é espantosa: “Vou ficando por aqui, antes que a KGB me localize... Saudações, camarada!” Vou te contar uma história. No início dos anos 80, numa oficina que dei na Biblioteca Pública Josué Guimarães, tive a honra de ter entre meus alunos um “araponga”, ou “comissário” ou “espião” da ditadura, como queiras chamar. Depois de algumas semanas, ele me disse: “Olha, professor, gostei tanto das tuas aulas que preciso confessar, eu estou aqui incumbido de fazer um relatório sobre a tua pessoa. Não és nada do que imaginávamos”. É engraçado: os direitistas me acusam de ser bicho-papão; os esquerdistas, de ser “padre”, conservador etc. É, ter opiniões próprias, defendê-las, não ter medo dos poderosos, pregar a democracia e a verdade dá nisso. É o preço que preciso pagar, e eu o pagarei, a despeito dos anônimos, dos covardes, dos desonestos. Saudações democráticas, inclusive aos nazistas, fascistas, comunistas e tantos outros apegados às etiquetas, aos chavões e às idéias feitas.

terça-feira, 5 de janeiro de 2010

As botas do gigante

Hoje, em doce flanerie pelo centro da cidade, na companhia de Sofia, depois de comprarmos revistinhas da Mônica e do Cebolinha, resolvemos visitar as botas do gigante, no Museu Julio de Castilhos.

Sempre que posso, visito as botas do gigante. Certa vez, lá se vão anos, li para a Maíra, minha filha mais velha, a história de João e o Pé de Feijão. Como ela ficasse incrédula, levei-a ao museu e mostrei-lhe as botas, como prova irretorquível de que existem gigantes. E hoje, quis repetir a experiência com Sofia, a filha mais nova. Quis mostrar-lhe as botas, que são talvez o objeto mais raro e mais estranho da história do Rio Grande do Sul. Porque as outras quinquilharias do museu são previsíveis, são comuns e encontráveis em qualquer acervo, inclusive em museus particulares no interior. E além do mais, em geral, são objetos heróicos, manchados de sangue, símbolos de nossa intolerância, violência e estupidez. Mas as botas do gigante não. Elas são prosaicas, vivas, inocentes. Elas são curiosas, e provam que aqui viveu uma aberração da natureza, um homem gigantesco. Junto às botas, havia uma foto fantástica, que provava mais uma vez que as botas tinham dono, que não foram feitas por algum sapateiro brincalhão.

Entramos e fomos avisados que não se pode mais visitar aquele par de relíquias. Segundo um funcionário, as botas foram escondidas, não estão mais em exposição, por ordem do diretor.

Perguntei por que e a resposta que ouvi foi esta:

"Por que elas eram muito visitadas... O diretor quer se valorize outras coisas expostas no museu..."

Ah, entendi... A política cultural do estado-atual-a-que-chegamos é esconder as botas! Economizar talento, economizar gerenciamento, economizar visão pública.

Estou, mais uma vez, literalmente, embasbacado. Em que, mesmo, as botas incomodavam o Museu Julio de Castilhos? Atraíam público? Elaboravam demais o fetiche do tamanho, tão caro ao guasca gaudério? Concorriam em ostronenie com alguém do governo?

Segundo o mesmo funcionário, as botas atraíam muitos visitantes que, uma vez lá dentro, visitavam outras partes do museu.

Governadora, Vossa Excelência já nos tirou muitas coisas, mas, por favor, devolva-nos as botas do gigante!

Como é que nossos filhos vão acreditar em contos da carrochinha, como é que vamos acreditar na política (é mais fácil acreditar em mitos literários, não é mesmo?) se a prova cabal da existência do Pé-de-Feijão foi retirada do museu?

segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

Um pequeno e extraordinário adesivo

Quando viajo, não gosto de contemplar os grandes monumentos, as suntuosas catedrais, as largas avenidas. Meu olhar de viajante repousa nas pequenas coisas, nos detalhes insignificantes, porque são eles que, a rigor, dizem verdades profundas sobre os lugares que visitamos.

Monumentos, catedrais e avenidas todos os países do mundo têm. E, em geral, são semelhantes, ufanistas e autoritários. Impõem-se aos nossos olhos com uma veemência embaraçadora. Os monumentos são emulações da guerra, as catedrais são declarações de insensatez e as avenidas são sinônimos da pressa, do ruído e da poluição.

No Uruguai, um pequeno adesivo, colado à altura dos olhos em inúmeros mictórios de restaurantes, de postos de gasolina e de hotéis me disse mais sobre a sociedade “celeste” que as ramblas, as estátuas eqüestres, os templos e assemelhados.

Ali, em espanhol claro e simples, e que só podia ser lido por machos no ato de micção, estava escrito: “Para ser um homem de verdade não é necessário que sejas violento com as mulheres”.

A adequação do local, a propriedade do instante, a inegável reflexão que a mensagem necessariamente provoca em quem a lê me levaram a considerar este detalhe o mais interessante dos que vi no país vizinho.

Uma mensagem dessas, aposta num espaço que todos os homens são obrigados a freqüentar, pelo simbolismo (a leitura com o falo na mão), graça e inteligência tem um poder espantoso. Não se sai de uma experiência dessas da mesma forma como se entrou. A bexiga poderá ficar aliviada, a consciência não.

Contra a barbárie e a selvageria, contra o preconceito e a falta de caráter, só há um caminho: a educação. E se for necessário iniciar esse processo pelo mictório, que seja. Curiosamente, em todos os locais em que vi essa mensagem não havia sequer uma das costumeiras frases escatológicas que infestam os banheiros públicos.

domingo, 3 de janeiro de 2010

Para sair da merda, presidente!

Passei a virada no Uruguai, em companhia de Marta, Sofia, Guido, Cynara, Reginaldo, Jajá, Pena Cabreira, Sandra, e amigos do Pujol, e filhos e genro do Guido.

Muito eu teria para contar sobre a viagem (viajar é trocar a alma de casa, a gente só começa a viajar de verdade quando retorna), mas quero apenas estabelecer uma diferença entre o Brasil e o Uruguai.

Em La Paloma, um minúsculo balneário, visitei 4 boas livrarias (duas delas com mais de dez mil títulos em exposição). Comprei livros de Julio Cortázar, Jorge Luis Borges, Mempo Giardinelli, Isaac Bashevis Singer, Guillermo Martínez, antologias de contos, fotobiografias e outros.

O Brasil inteiro deve ter em torno de 1.000 livrarias, talvez menos. Certamente o Uruguai tem mais. Se um vilarejo tem 4 livrarias, quanto terá o país todo?

Só para provocar: Paris tem mais de 2.400 livrarias...

Em todas as áreas o Brasil explode: cresce a classe média, mais de 40 milhões de pessoas abandonam a linha de pobreza, as vendas de automóveis e eletrodomésticos ampliam-se enormemente, estamos emprestando dinheiro ao FMI, seremos em breve a quarta economia do planeta, e, enquanto isso, a Feira do Livro de Porto Alegre despenca 18,5% (a área adulta caiu 16% e a área infantil 21%) em 2009.

Que fantástico serviço à cultura (e cultura é a mais poderosa arma civilizadora) faria o Lula se aparecesse em público com um livro nas mãos e dissesse:

– Para sair da merda é preciso ler mais! Desde ontem, sou um leitor e conclamo os 80% de brasileiros que aprovam o meu jeito de governar a fazerem o mesmo!

Se o presidente der esse exemplo, prometo que não me mudarei para o Uruguai!