sábado, 9 de janeiro de 2010

Fazendo política

Antes que me acusem de “estar fazendo política”, quero deixar bem claro que “estou fazendo política”. Para quem vive em sociedade, para quem não anula o voto, como eu não anulo, para quem escreve, para quem leciona, a política é o próprio ar que se respira.

Todos os atos humanos, fora do essencialmente natural, são atos políticos. Por isso, me causa espanto e riso quando ouço dizerem que a “oposição está politizando isto ou aquilo”, como se a “situação” não estivesse exercendo a sua política o tempo todo.

No dia em que se assume um cargo, inicia-se a luta pela manutenção do cargo. Esta é a dinâmica da vida social. É um direito e um dever dos que perderam seus cargos lutarem pelo retorno ao statu quo ante. E se não lutamos por cargos, como é o meu caso, lutamos por aqueles que, no cargo, expressem a nossa visão de mundo, ou seja, aqueles que façam a nossa política.

A tese, por exemplo, da neutralidade política é detestável. Porque ela, na verdade, esconde o que o ser humano tem de mais humano, a consciência. O neutro, lá no fundo do coração (como dizem os ingênuos e românticos), sabe muito bem de que lado está. A sua neutralidade é uma máscara, uma hipocrisia, um medo risível de não se expor, de não pagar o preço por assumir uma posição. A rigor, é um verme, como dizia Nietzsche, que se encolhe para não ser pisado.

Prefiro os meus antípodas políticos, porque com eles posso estabelecer relações confiáveis, baseadas no respeito ao contraditório. O neutro assemelha-se ao anônimo, que age na sombra, destilando rancor, e desvelando sua profunda insegurança e falta de cidadania.

O neutro esgueira-se, com medo de perder algo quando o poder trocar de mãos. Neutro, pode agir como agente duplo, traindo ao mesmo tempo a dois senhores.

Prefiro os quentes e os frios, porque os mornos me dão asco.

4 comentários:

  1. Uma de tuas melhores crônicas. Irretocável.

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  2. Charles, magníficas palavras.
    Se me permites, acrescento um pequeno detalhe em teu pensamento:

    O neutro trai a si próprio, desrespeita sua consciência (quando a tem).
    Sente medo de perder algo, apenas por não se dar conta que nada tem a perder.

    Muita Paz e muita Luz para todos.
    Judith Riboni.

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  3. Eu discordo. Acho que a neutralidade tem de ser aceita plenamente. O que tem de ser criticado é a opinião pela opinião. Lá no fundo do coração, ninguém sabe nada. No cérebro, depois de muito pensar, ouvir, falar, discutir, ler, talvez haja alguma coisa.

    Essa pressão pela expressão de opiniões sobre tudo faz com que expressemos opiniões apressadas, impensadas, que, depois, acabamos por defender irracionalmente.

    E quem não vê o horário político?
    E quem não lê política no jornal?
    E quem não tá nem aí?
    Fica neutro.

    Pra mim, jovem, por exemplo, a política é insana. Um sistema que seria substituído com melhoras até por um sorteio randômico de pessoas para os cargos não específicos. Não específicos, como Presidente, por exemplo. Meu voto vai pro padeiro mais próximo.

    Sem neutralidade, teu aluno,
    Ricardo Kroeff.

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  4. Assino embaixo e por todos os lados.

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